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blogue do siman

escritor • crítico • diretor de teatro • editor

uvas passas

Maio 29, 2016

 

quando tudo passa

não dá-se conta de que existiu

só se sabe que passou

de repente

passou

o que não iria passar

o que era o fim do mundo

o que te mataria

o que acabaria com o futuro

— seu e da nação —

passou

 

o importante é que tudo passa

e passa muito bem

                               , obrigado

Cultura do estupro: a culpa também é nossa

Maio 28, 2016

 

     Nesta semana o país inteiro se voltou para o fato absurdo de uma adolescente ter sido estuprada por trinta e três homens no Rio de Janeiro na noite desta quinta-feira (26). Afinal, o que leva homens a praticarem um ato tão horripilante como este?

     Não há uma solução a curto ou médio prazo para desconstruir esta maldita cultura do estupro, pois é uma herança que temos do patriarcalismo (que ainda reina na nossa sociedade, mesmo que com menos intensidade — relativo aos séculos XVIII e XIX) que tem raízes fincadas na história.

     Uma menina é criada para não sair à noite, não vestir roupas curtas, não usar batom vermelho e outras coisas absurdas que cresce ouvindo; na verdade, o menino deveria ser ensinado que o corpo é propriedade da mulher — e tão somente dela —, que violentar uma mulher é crime e é digno de repúdio, que menosprezar o sexo feminino não é correto, tendo em vista que todos são iguais, etc., etc., etc.

     A cultura do estupro só será desconstruída quando a discussão de gênero e respeito for cultivada nas escolas e no âmbito familiar, propondo pontos de vista absolutamente diferentes deste, de que a culpa é da vítima, e não do agressor.

     A culpa desta adolescente ter sido estuprada não é somente dos homens que a estupraram, muito menos dela: a culpa também é nossa, e o sangue de milhares de mulheres que são violentadas todos os dias no Brasil e de milhões em todo o mundo escorre por nossas mãos; escorrem também — e principalmente — pelas mãos do Congresso, que alimenta, com esta onda conservadora, cada vez mais a famigerada cultura do estupro. Somos todos Pilatos. Lavamos nossas mãos e esquecemos da responsabilidade que temos na propagação da misógina cultura do estupro.  Mulheres cis e trans são mortas diariamente após serem violentadas, e nos calamos diante deste fato. Guardamos em nossos rostos um “silêncio sorridente” e irônico diante da violência contra a mulher.

     E agora, no cenário político atual, a mulher é tão somente minoria, simplesmente escrava braçal e sexual de monstros famintos e desumanos.

     Como diria a adolescente estuprada nesta quinta, “não dói o útero, e sim a alma!”

     Isto não precisava acontecer para que acordássemos deste coma de submissão em que estamos confortavelmente instalados. Não nos esqueceremos de todas as mulheres já violentadas, e não cultivaremos mais esta cultura inescrupulosa do estupro! Lutemos pelo direito de ir e vir e pela autonomia da mulher, acima de tudo!

     Estupradores não passarão!

 

Vinícius Siman

Ipatinga, 28 de maio de 2016

pra goretti

Maio 28, 2016

a goretti de freitas, eminência máxima

 

ela ilumina os meus dias

em cada página, cada verso

e eu, insistentemente imerso

em sua mais que doce poesia

 

ela irradia a luz deste sol

em cada verso, cada página

eu a vejo — já não lembro nada

na folha, um poema, um atol

 

ela me faz poeta sempre

interminável semente

dos amantes da poesia

 

e todos os dias passados

não serão mais olvidados

só porque ela sorria

felino

Maio 28, 2016

 

bicho de cara peluda

que me encanta

          doce

e me inebria

          algoz

     de noites & dias

de queda e foz

 

bicho de boca carnuda

que me espanta

          fosse

o que era

          canto

     e não era tanto

de deleite e encanto

 

bicho que nunca muda

que me serve de manta

          deitado

na relva

          ;sonho

     e era só fantasia

de um rosto risonho

 

(que sorriso é esse teu?

que infame desacordo com o mundo

(e os encantos do mundo)

e tudo

um tanto

me iludo

— mas não desencanto)

 

felino de unhas e dentes

de garras e presas e estalos

          :prenda-me a teus pés

e não me deixes soltá-los

será arte?

Maio 15, 2016

 

Se o inimigo deixa uma porta aberta, precipitemo-nos por ela.

SUN TZU, A arte da guerra

 

nas entranhas do mundo

descansa o objeto indesejável

          que o universo já expulsou de seu meio

          e que os homens — quando vai — desconhecem como irmão

 

                              o objeto

                                   abjeto

                              impõe fé

                              nos dejetos humanos

 

          na lixeira do universo

          expulso das coisas cósmicas

                    impelido a expurgar as galáxias

                                    a aniquilar os astros

                                    a cegar os olhos dos homens

                    nasce o objeto não-identificado

                              que não sobrevoa nos ares

                              — pois os céus o expulsaram —

                              mas percorre os labirintos

                                        nas partes mais profundas da terra

que fervilha o sangue dos homens

e forma milícias e destrói províncias

 

                              nasce

                              no seio desta humana terra

                              a arteorrenda da guerra

foi tudo ilusão passageira que a brisa primeira levou?

Maio 13, 2016

escrito ao som de "cantiga brava", de geraldo vandré

Eu, que dos filhos teus

Fui te querer demais

VANDRÉ & MANDUKAPátria amada idolatrada salve salve

 

          descer a rampa

          e subir o altar da veleidade democrática

seguir a caminhada mesmo interrompidos os passos

seguir com os braços

seguir com as forças que desconhecemos

seguir lutando

           velando

pela delicada flor

que agora perde mais uma pétala

                                                      — mas não murchou!

 

descer a rampa

e subir o panteão da história

e beber do vinho de jango

e comer da ceia de olga

                            junto de marighella

                            e herzog

 

(ano de 2064 — retrocesso)

 

                                        descer a rampa

                                        e pisar em rosas

                                                  literais

                                        mas na esperança

                                        de ainda deixar

                                        a delicada flor intacta

                              e que não a despetalem mais

 

descer a rampa

e descê-la com gente

                 com mulheres

                 com negros

                 com pobres

                 com graça e dignidade

     sem perder a honradez

     e o amor à pátria

     e à delicada flor

 

não irei impor

nome a esta abstrata e platônica flor

mas se alguém pôr algum dia

que chame-se democracia

pietà

Maio 09, 2016

Morreu no colo da mãe

Na canseira da demência

Morreu sem vela, só lágrimas

Daquela triste presença

NENA DE CASTROPietá

 

...e no banco do brazil, uma mulher sentada no chão — à porta —, com as pernas cruzadas, uma criança no colo que risca besteiras num papel qualquer. “me dá uma ajudinha, pelo amor de deus”, pede, choramingando, “me dá uma ajudinha, pelo amor de deus”. todos passam e dizem que não têm dinheiro, mesmo contando bolos cheios após terem saído do caixa eletrônico. uma mulher sentada no chão, com uma criança brincando com um lápis e um pedaço qualquer de papel — desenhando maravilhas — em seu colo, implora, chorando “uma ajudinha pra matar a fome do meu filho, pelo amor de deus”. pelo amor de deus. pelo amor de deus. pelo amor de deus. PELO AMOR DE DEUS. e ela talvez tenha se acostumado a todos os que viram a cara e não respondem nada, e aos que respondem somente “não tenho” “não posso” “não...”. ela para de pedir dinheiro. agora pede comida. comida pro filho. (“não tenho” “não posso” “não...”.) a mulher, sentada no chão, à porta do banco do brazil, chora por seu filh(crist)o morto

                                                                de fome

das medusas de vanuza

Maio 06, 2016

a vanuza barbara e sua exposição “trans-bordando em chica”

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na foto, rubem e eu apreciando a obra de vanuza barbara. foto: © nilmar lage

 

...e cada peça me olha como se eu estivesse sendo exposto, e as fotografias pregadas na parede — também! — me olham, me encaram, me devoram. a arte de vanuzabarbara me devora, me engole (e me cospe), me trans-borda. as fotos de nilmarlage, igualmente, me devoram, me engolem (e cospem), me trans-formam. viajando nos labirintos místicos da história quase perdida que me encontra num ímpeto todo brutal da vida de chica da silva.  o desejo bárbaro de me cortar e me perfurar e me jogar em pedaços num passo que se reanima a cada passo, a cada peça, a cada poça de sangue escravo que adeja sobre nossas cabeças feito chuva e suja-nos de vermelho e preto. não me suporto — nunca me suportei! — olhando, quieto, essa arte que me toca inquietamente, talvez até literalmente, mas me toca com os lábios — superiores e inferiores; me toca com os olhos — inferiores e superiores; me toca com o martírio dos escravos que eram castigados em dias inferiores

               cada peça

               é uma medusa

               no labirinto

               de vanuza

e meus olhos saltam, e a arte me cega. e meus olhos recuperam-se, e a arte me cala. e minha garganta se recupera, e a arte me ensurdece. pra que isso tudo se o mundo é escasso? — pra que o embaraço, se tudo é mudo? e cada peça me devora como se eu fosse um prato posto...

memalukan ou chaos ou lanet deli

Maio 04, 2016

 

Ele me considera um homem boníssimo, de qualquer modo um homem ingênuo, no fundo sensatíssimo, um homem de boa vontade, um suíço.

MAX FRISCH, Stiller

 

, enquanto isso, num lugar qualquer, pessoas quaisquer fazem festas sem motivo, e bebem e trepam e fumam maconha sem limites. “a pederastia rola solta em locais como este!”, exclama jorge, que não sei se é de fato jorge porque é só mais um qualquer; enquanto putas e travestis deleitam-se nas moedas, os homens deleitam-se na orgia com seus respectivos pares ou trios ou grupos de mulheres e travestis, enquanto os cafetões observam, atônitos, enquanto uma música estranha começa a tocar no bar ao lado, enquanto os bêbados bebem e fumam cigarros sem limites, e os cantores esganiçam uma versão lusófona de “aline” que jamais ouvira antes (“e eu chamei, chamei/ aline! estou aqui/ e eu chorei, chorei...”) e eu passo e passo e passo enquanto aquilo tudo acontece eu passo, e não sei se na verdade jorge era jorge, como antes disse — como não sei se eu, na verdade, sou eu —, só foi o primeiro nome que me veio à cabeça quando ouvi sua voz e quase vi seu rosto pelas frestas de um lugar qualquer e quando ele me

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